segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Drogas

Meu filho.

Criptonita, superamendoim e outras dessas coisas que tu vês nas revistas em quadrinhos e nos desenhos animados, e que te transformam, de repente, em uma pessoa mais inteligente, mais forte, mais rápida, na verdade existem. Nós, adultos, a chamamos de drogas. Eu não as conheço pessoalmente, mas elas devem ser muito gostosas, porque depois que as pessoas começam, elas não conseguem largar. Ficam viciadas. O problema são os efeitos que elas trazem. Não só você volta a ficar menos inteligente, mais fraco, mais lento, mas também mais pobre. Há quem chegue a matar e a roubar, para manter essa ilusão. No final o Super Homem volta a ser uma pessoa comum e o Super Pateta vira pateta novamente.

Assim expliquei para meu filho, o tema das drogas, quando ele era um menino de oito ou nove anos. Eu tinha dois medos. Falar na adolescência, quando tudo que os pais falam é considerado bobagem, poderia ser muito tarde. Queria que ele começasse a observar desde cedo. Segundo, se tanta gente fica viciada, as drogas devem produzir uma sensação de prazer. Não queria dizer que elas eram ruins e, depois, se ele experimentasse, imaginasse que eu havia mentido. Por isso, disse, são boas, os efeitos é que são terríveis. A conversa foi uma só vez. Anos mais tarde, lendo uma redação do cursinho pré-vestibular, veio-me um sorriso ao vê-lo descrevendo exatamente esse conceito.

Após o assassinato tive de esperar quase um mês para receber a autopsia. O resultado não foi surpresa. Estava absolutamente limpo de toda e qualquer substância, inclusive álcool. Quem nunca fumou, dificilmente seria um usuário de drogas. Não fomos pais perfeitos, mas nesse caso funcionamos.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Um verbo chamado Violência!

Eu procrio
Tu abandonas
Ele vagabundeia
Nós alimentamos
Vós absolveis
Eles violentam

Diagnosticar corretamente um problema significa metade de sua solução. Os últimos vinte anos trouxeram a tese de que a criminalidade decorre do modelo econômico capitalista. Assim o criminoso, de agente do mal, passou a ser visto como vítima da sociedade. Policiais, civis ou militares, em lugar de heróis do bem na luta contra o mal, são encarados como torturadores, corruptos, agentes da ilegalidade. Vigiem-lhes os passos com rédea curta. Aos inocentes compete sofrer em silêncio. Só desse modo compreende-se a louca lógica que rege a lei penal vigente.

Quinhentos anos de história não foram capazes de gerar um país justo. Éramos injustos, mas seguros. Morador de uma pequena cidade, por muitos anos deixei meu carro aberto, na rua, defronte o negócio. Hoje, chaveado, alarme ligado, totalmente segurado, fica protegido atrás dos muros. Continuamos um país absolutamente iníquo juntando a isso o campeonato mundial da violência.

Se o sistema capitalista é injusto, e é, como o sistema feudal da Índia, mais injusto ainda, produz menos crimes que nos EEUU? Fala-se também na escolaridade, esquecendo-se de que a Califórnia é o Estado com dois recordes – o maior orçamento educacional e a maior população prisional. Violência tem a ver com educação sim. Aquela dada pela figura paterna, que impõe limites, respeito ao direito dos demais. Conhecimento científico vem do professor. Formação do caráter é responsabilidade intransferível da família. Não por outro motivo 57% dos presos americanos não conhecem um ou ambos os pais ( pesquisa de Harvard). Estatísticas em Brasília (*) mostram quadro semelhante no Brasil. Desestruturação familiar essa é a verdadeira semente da criminalidade.

Numa terra tão sofrida, numa vida tão difícil, vamos furtar do povo o prazer simples e gostoso do sexo? Sem a culpa de pôr no mundo um filho que não terá condições materiais de criar. É criminoso desconhecer a Lei 9.263, da paternidade responsável. Graças ao empenho de Dona Ruth Cardoso é direito de qualquer cidadão. Todos os métodos e técnicas são assegurados. Todos os homens ou mulheres, com mais de 25 anos, têm direito à vasectomia ou laqueadura de trompas, sem maiores exigências. Ou, independente da idade, qualquer cidadão que tenha dois filhos vivos. Proclamemos essa nova aos quatro ventos. Autoridades de saúde habilitem-se a prestar esse serviço!

Não existe na língua portuguesa ou em qualquer outra língua do mundo um verbo que expresse o ato de criar uma sociedade extremamente violenta. Seria um verbo mais do que irregular. O absurdo é tão grande que teríamos de criar nova categoria - o verbo caótico. Conjugado com mostrei acima.

Mulheres que procriam sem maiores dores de consciência. Homens que as abandonam com se fossem um papel de embrulho do prazer. Filhos jogados ao léu. Quem foi amado, como fui, por meu único rebento, não pode compreender essa atitude. O carinho de um filho é a maior benção que podemos receber na vida. A solidariedade, esse imenso coração brasileiro, vai as alimentando. Leis, que leis? Absolvem-se todas as faltas.

O fruto de tudo isso nos ataca e violenta!

(*) Conclusões de Pesquisa no Complexo Penitenciário da Papuda, 1996. “O ambiente familiar desestruturado contribui sobremaneira para a deformação do caráter dessas pessoas”.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Pais e Mestres

Sou casado, de papel passado, com a mesma mulher, há quase trinta anos. Uso frequentemente as expressões, por favor, muito obrigado; cedo lugar à mulher grávida e a pessoa idosa. Antigamente tudo isso era o padrão, hoje uma exceção.

Atualmente, homens e mulheres trabalham fora. Comem na rua, com pessoas que não são de sua família. Saem cedo e chegam tarde, cansados. Natural, que nesse momento, queiram ser amigos das crianças, fazendo de tudo por um pouco de paz e sossego. Daí a querer empurrar toda educação para a escola é um passo.

Se muitas coisas mudaram, outras são imutáveis, como o significado e a divisão de responsabilidade dos verbos educar e ensinar. Acostumamo-nos a usá-los como sinônimos, mas têm significados bem precisos. Os pais educam; os professores ensinam. O próprio dicionário nos dá a diferenciação. Educar significa criar, desenvolver as faculdades psíquicas, intelectuais e morais; praticar os hábitos sociais. Para nós homens, em bom português, dar limites!

Aos professores compete ensinar, que significa, transmitir conhecimentos. Os jovens vão à escola estudar português, matemática, ciências, etc. A nova realidade familiar está trazendo para a escola um aluno que desconhece o significado da palavra – não. Revoltam-se contra os professores que os contrariam e, de modo desvirtuado, escondem-se no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Há aluno querendo tratar os mestres como serviçais, o que já seria uma grosseria, e os pais dando a maior força.

Há um milagre que, professor algum, jamais conseguirá fazer, dar limites a uma criança que não traga de casa a noção. Em verdade, só os educados podem ser ensinados!

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

É preciso matar mais jovens, por Luiz Fernando Oderich

A opinião pública brasileira está perplexa diante da possibilidade concreta de liberação dos assassinos do jornalista Tim Lopes. Como pode ser? Não eram traficantes já com várias condenações anteriores? Não se valeram de tortura e vilania para executar seus crimes? Parece que foi ontem que isso ocorreu.

Ninguém sente mais a iniquidade desse tipo de justiça que os familiares das vítimas. Por isso, há quatro anos, liderados por Cleyde Prado Maia, do movimento Gabriela Sou da Paz, ajudamos a coletar as assinaturas necessárias (1,3 milhão, em mais de cinco Estados da federação) e fomos a Brasília apresentar um conjunto de mudanças necessárias ao processo penal brasileiro. Nós, pais e mães de todo o Brasil, viajando às próprias expensas, entregamos ao então presidente do Senado, Renan Calheiros, a emenda popular à qual ele prometeu, na frente das câmeras, dar “urgência urgentíssima” na tramitação da matéria. No escurinho dos gabinetes, engavetou o projeto. O motivo: as assinaturas vinham acompanhadas do nome e da carteira de identidade das pessoas, mas faltava o número do título de eleitor!

Como se o voto não fosse obrigatório no país.

A bem da verdade, conseguimos apenas acabar com a figura do “protesto por um novo júri”. No entanto, para nós, a progressão da pena deveria partir do total de anos a que a pessoa foi condenada. Por exemplo: se somados todos os crimes o bandido foi condenado a 150 anos de prisão, sobre esse número seriam contados os privilégios legais. Resolveria a questão do caso Tim Lopes.

Agora, completados dois anos da morte do menino João Hélio, já podemos ter certeza de que toda aquela brutalidade não foi suficiente para comover o Congresso Nacional. Precisamos matar mais jovens, precisamos imaginar modus operandi mais horroroso do que arrastar um menino pelas ruas do Rio de Janeiro. Como disse a ministra Ellen Gracie, aquele foi um momento de grande emoção, inconveniente para se mudarem as leis. A emoção passou, exceto para os pais daquele menino e dos muitos outros que estão sendo mortos diariamente, de modo mais discreto.

Talvez matando mais, as lágrimas dos familiares das vítimas um dia consigam amolecer o coração de pedra dos congressistas a endurecer as nossas leis molengas.

Artigo publicado no jornal Zero Hora de 07/02/09.