terça-feira, 21 de maio de 2013

Obrigatoriedade das tornozeleiras e a eficácia do controle prisional

Após 10 anos, finalmente entrará em operação o projeto de monitoramento de presos por meio de tornozeleiras. O governo gaúcho estima investir R$ 2,5 milhões na compra de mil equipamentos até o final do ano. Inicialmente, a Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) estima que 240 presos do regime semiaberto se interessem em usar o equipamento. A Vara de Execuções Criminais (VEC) tem 30 nomes confirmados, mas, de acordo com a Susepe, há mais 40 apenados cadastrados e outros 170 em processo de seleção. Atualmente, esses detentos trabalham durante o dia e voltam à noite aos albergues. Com a tornozeleira, poderão dormir em casa e conviver com as suas respectivas famílias. O itinerário diário do apenado será delimitado pela Susepe. Cada agente do órgão poderá monitorar entre 250 e 300 presos. Se houver um afastamento da área estabelecida, um alerta on line será emitido, e o preso passa a ser considerado foragido. Imediatamente, a Brigada Militar será avisada e começará as buscas. O aparelho funciona com sinal GSM (igual ao usado em celulares e em aparelhos de radiofrequência) e sua bateria dura entre 24 e 48 horas. A eficácia da tornozeleira como método de monitoramento, inclusive, já foi comprovada em 2010. Na época, um foragido do Rio Grande do Sul foi localizado por meio do equipamento que usava em Bragança Paulista, no estado de São Paulo. O projeto seria bom, não fosse o fato de o uso ser opcional. A maioria dos presos não aceita usar o equipamento. Prefere ficar em albergues, onde há pouco controle carcerário a ter uma liberdade vigiada. Uma das alternativas estudadas pela Susepe seria condicionar o uso das tornozeleiras ao trabalho. Só poderia sair para trabalhar o apenado que aceitasse usar o equipamento. A medida, contudo, pode não ser suficiente para atrair mais interessados. Em razão da vigilância precária dos albergues, presos sem trabalho externo também saem às ruas para assaltar, matar e traficar. Inclusive, há algumas situações em que foram flagrados porte de bebidas alcoólicas, drogas e de aparelhos celulares nas dependências das instituições penais. Nesse sentido, entra em questão a problemática relativa ao controle precário dos albergues prisionais. Uma vez que, se o sistema de segurança funcionasse, todos iriam querer usar as tornozeleiras. Como não funciona, o preso prefere ficar no albergue de onde pode sair sem ser vigiado a ficar em casa com o equipamento. No Instituto Penal de Viamão, considerado um dos piores albergues do Estado, por exemplo, de 250 apenados, apenas cinco se candidataram. Dessa forma, avalio que não se deve dar opção, enquanto a população é vítima de crimes todos os dias. O uso da tornozeleira deve ser obrigatório, especialmente, pelo fato de ser a única alternativa ao controle prisional.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Um batalhão de jovens interditados, por Afif Simões Neto

Nesse espaço deveriam apenas aparecer textos escritos por mim. No entanto, achei esse texto tão oportuno, no momento em que a sociedade brasileira começa a discutir a descriminalização do consumo de drogas, que resolvi colocá-lo nesse espaço. Quem puder, além de ler, deve fazer todo esforço para divulgá-lo. Boa leitura, Luiz Fernando Oderich Um batalhão de jovens interditados, por Afif Simões Neto* Sou juiz de Direito em uma das Varas de Família e Sucessões de Santa Maria. São duas ao todo. Na que trabalho, devem circular perto de 3 mil processos. Desses, uns 200 são de interdição. Para quem não sabe, alguém é interditado quando, com mais de 18 anos, perdeu a capacidade mental para a prática de atos da vida civil, por qualquer um dos motivos indicados pela lei. Decretada a interdição, será nomeado curador para a proteção da pessoa e dos bens do interdito, que, por exemplo, não pode casar-se, assinar contratos, abrir uma conta bancária, uma sapataria, comprar uma bicicleta nem que seja. Nenhum documento assinado por ele tem validade. Vira uma coisa, pois não tem vontade própria, dependendo exclusivamente do que os outros possam fazer por ele. Realizo as audiências de interdição em uma quarta-feira do mês, à tarde. São sempre mais de 12 processos pautados. Pois bem: dois deles, dando de barato, dizem respeito a jovens, com até 30 anos ou um pouco mais. Quando algum laudo médico acompanha a petição inicial, é certo que o CID aponta a esquizofrenia como causa para interditar, e mais certo ainda que todos eles – eu disse todos – confessam ao juiz que passaram a consumir maconha ainda na idade juvenil. O pontapé inicial da desdita foi dado, invariavelmente, pelo “inofensivo baseado” fumado na saída do colégio ou nas festinhas da turma. Claro que indivíduos que já sofrem de esquizofrenia e apresentam histórico pessoal de consumo da erva ou outras substâncias demonstram um início mais precoce da doença do que aqueles esquizofrênicos que nunca usaram maconha ou outras drogas. Mas o que quero relatar aqui é que passou a me assustar, analisando os processos de interdição de pessoas jovens, a relação “consumo de maconha – esquizofrenia”. Pelo que dá para ver, o uso regular da Cannabis sativa apresenta um risco potencial para o desenvolvimento de transtornos esquizofrênicos, e esse risco está diretamente relacionado com a utilização contínua do entorpecente de forma precoce. Assim, é lógico, é evidente, salta aos olhos, que a redução do uso da maconha entre os jovens poderia colaborar efetivamente na prevenção de futuros casos de esquizofrenia. Mas aí, o que se vê, ao invés de campanhas nacionais agressivas para alertar dos riscos do consumo, são notáveis de academia – que da missa não sabem a metade – apresentando proposta para alterar o Código Penal, a fim de que a maconha seja legalizada, sob o fundamento de que sua utilização seria reduzida e que eliminaria a ação dos traficantes. Acontece que o traficante também vende crack, cocaína, heroína, ecstasy e outros tipos de drogas. Além disso, em países como Holanda, que liberaram o “bagulho”, foi comprovado que em nada diminuiu o consumo. A maconha é nociva, sim, e é a porta de entrada para uso de outras drogas, ou vocês conhecem algum craqueiro, já na finaleira da vida, que não tenha sido maconheiro antes? Pena que as ações em Vara de Família corram em segredo de Justiça. Se não fosse assim, gostaria muito de convidar essa gente liberal, que acha o máximo liberar maconha para adolescentes, para dar uma passadinha, sem compromisso, numa quarta-feira à tarde, na 2ª Vara de Família de Santa Maria. Talvez o desespero de um pai, de uma mãe, pedindo ao juiz, pelo amor de Deus, que interdite o seu filho amado, que mais parece um zumbi fuçado pela maconha, pudesse trazê-los à realidade. * Afif Simões Neto é Juiz de Direito.